Atualmente, na maioria das companhias, não há ninguém realmente de olho no dilema acima porque “todo mundo está de olho”, não é verdade? E sabe por que isso acontece? Para entender, acompanhe o raciocínio a seguir, detectado durante a fase de pesquisas para o livro “Feitas para o Cliente: As Verdadeiras Lições das Empresas Feitas para Vencer e Durar no Brasil”, de minha autoria juntamente com o Roberto Meir, um dos principais especialistas em relações de consumo no Brasil.
Quando o cliente envaidecido resolve se converter de prospect para cliente e efetua sua compra, portanto seu cadastro, comete “a maior burrada de sua vida”. Como assim? Isso mesmo! Na maioria das empresas, o cliente prospect, se podemos definir assim, é gerenciado pelo marketing, mas o cliente de verdade, e não o potencial, aquele que injeta recursos na companhia comprando e recomprando produtos e serviços, é gerenciado por diversos outros núcleos, como a Área de Clientes (especialmente em empresas de alto volume de transações para bases grandes, como operadoras de telefonia e seguradoras) ou pela a Área de Operações (na maioria das empresas). E o que acontece, então? O cliente se torna um log, um código, um número numa massa de números.
Sim, o cliente, antes ativo e atraente, se torna passivo e indesejável, objeto com a tarja de custo colada em si, algo intrinsecamente ruim, que deve ser minimizado. Para piorar pensa que tem direitos que não deveria ter… mesmo sendo amparado pela Constituição – como Código de Defesa do Consumidor, por exemplo. Quem disse que o cliente pode causar alvoroços e incômodos no dia a dia da empresa, mandando e-mail, esperando resposta, ligando no call center e aumentando o custo de atendimento? Outra questão: O cliente pode reclamar, criticar, demandar o pós-vendas e a assistência técnica, usar as garantias e esclarecer dúvidas? Será que ele não percebe que isso tudo dá trabalho, faz perder tempo, custa caro e não traz dinheiro?
É por isso que o atendimento é tão ruim e os investimentos em relacionamento são pífios com canais insuficientes e mal estruturados. Não é à toa que muitos programas de fidelidade são descontinuados, já que custam caro para manter. É por isso que as promoções para os não clientes são sempre mais atraentes do que as promoções e condições para os atuais clientes. É tudo conta: custo de carregamento, custo de retenção, custo de transação, lucratividade média, ticket médio etc.
Vejam se isso não se configura como uma inequação absurda. Pare e pense: não é verdade que o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) fica em Operações em grande parte das companhias? Pense nos planos de renovação, nas promoções que você (cliente) não pode usufruir, mas sua esposa, que não é cliente ativa, poderá. Pense na ilogicidade de você, cliente há mais tempo, pagar mensalidades mais caras do que clientes novos (ora, a fidelidade e o “tempo de casa” deveriam se traduzir em descontos, não?). Pense quantos clientes cancelam assinaturas ou planos para aderirem novas assinaturas e planos, mais baratos, exatamente do mesmo produto ou serviço, na mesma empresa. É muito estranho. As empresas não fazem esse tipo de conta.
Claro, há sempre aqueles que olham para possibilidade de vendas cruzadas (cross-sell) ou de fazer com que o cliente suba de categoria do produto (up-sell). Quem são esses? O marketing, ué! Nesse momento, o marketing volta com tudo, como se nada tivesse acontecido, tentando “aumentar” o wallet share do cliente. Na prática, ele já é um passivo gerencial, a menos que ele vá reclamar na mídia ou nas redes sociais – ou se manifeste formalmente em sites de reclamação – mas essa é uma história que ainda está em desenvolvimento.
Consequentemente, as empresas vêm gastando horrores com os custos de retenção porque no ciclo de vida a retenção entra quando o cliente vai embora para a concorrência. E qual a receita da empresa para reter o cliente desgostoso e enfurecido? Descontos, brindes, cancelamento de dívidas, renovações gratuitas. Ou seja, mais dinheiro perdido para a companhia, que negligenciou encantar, satisfazer e fidelizar e agora corre atrás para recuperar, manter o cliente. Mas isso é obrigação de quem?
(Daniel Domeghetti, CEO da DOM Strategy Partners, consultoria 100% nacional focada em maximizar geração e proteção de valor real para as empresas)